Agora escrevo para ti


Agora escrevo para ti e partilho neste espaço, hoje é um dia importante por muitos motivos e tu acabaste por o fazer mais importante, a minha vida ficou marcada assim, antes de ti e depois de ti, sendo que o depois de ti ficará para o resto da minha existência, apareceste assim de surpresa quase de mansinho, afinal o médico tinha dito depois de uma trapalhada muito grande que tive e com a qual podia ter morrido que seria muito difícil engravidar e que talvez tivesse de fazer alguns tratamentos, no fim de contas bastaram só umas férias descontraídas e estavas instalado dentro de mim.

Não foi difícil escolher o teu nome, cedo o medico distinguiu que serias um rapaz, que chupavas o dedo, que terias um nariz arrebitado como o meu, e tudo decorreu como habitualmente, tu a cresceres e eu a sonhar-te a face, a comprar roupa minúscula e a derreter-me com sapatos de boneco, a preparar-me para chegares cá fora, essa parte foi a mais difícil, não querias sair de dentro de mim, demoraste três dias, nos quais médicos e enfermeiros franziam o sobrolho, e eu ficava sossegada a pensar em não me queixar porque tu ias fazer tudo valer a pena, e fizeste, mesmo quando te tiraram quase à força de dentro de mim e te levaram, eu fiquei numa agonia de estares longe, sem quase dar conta dos frascos e injecções, coisas que mediam no meu corpo, fiquei assim quieta e vazia à tua espera, mesmo depois de me dizerem que estavas bem, mesmo depois de o teu pai te ter visto e dizer que sim, só me convenci quando te me entregaram, embrulhado, marcado com o esforço de teres nascido, só quando peguei em ti e tu te acalmas-te, suponho por conheceres a minha voz, a meu batimento cardíaco, só aí olhámo-nos olhos nos olhos pela primeira vez, tinhas já esse teu ar misterioso, mas fizemos os dois o nosso reconhecimento, depois olhamos pela janela, era meia-noite e conseguíamos ver o fogo de artificio a riscar o céu em luzes de cores, expliquei-te que era um dia especial e que se festejava a Liberdade, daí para frente expliquei-te muita coisa, entretanto foste tu que me foste explicando outras, desde a impossibilidade dos Tiranossauros Rex serem carnívoros, explicastes que eram necrófagos, aliás como todos os tiranos, como aprendi que os filhos não são extensões de nós, nem da nossa vontade, são seres especiais que entram na nossa vida, para sempre, o grande reduto do amor incondicional, mas que irão fazer as suas escolhas, seguir as suas vidas, fazer as suas asneiras, que estarei cá sempre para te apoiar, criticar se for o caso, maravilhar-me com o teu olhar como naquela noite, ficar feliz com todas as tuas vitórias, inquietar-me com todas as dificuldades que tenhas, serás sempre o meu menino, o que não queria sair de dentro de mim.

Comentários

Jorge Mugabe disse…
Emocionante Ana.

Beijo.
Anónimo disse…
amor de mãe é o amor mais perfeito que possa existir....realmente emocionante
Fernando Samuel disse…
BOM DIA! BOM DIA!

Um beijo GRANDE.
Claudia Garcia disse…
Maravilhei-me com o encanto de sua narrativa, parabéns. Desde o Brasil