Dos amores impossíveis concretizados




Existem lendas familiares que se vão diluindo no tempo.
Dos amores impossíveis na família falo de um, hoje.
Os meus tios avós, Maria e Manuel, podemos chamar-lhes assim.
Ela era a irmã mais velha do meu avô materno, alta, grande, pele branca e nariz fininho, acho que a minha mãe é a pessoa mais parecida com ela.
Educada numa família tradicional, cheia de preconceitos, regras e afins, o que deve ter tido um efeito contrário, porque ela rebelou-se, o irmão (meu avô) acaba por ser um homem muito avançado para a época e a irmã mais nova foi a tal que aos setenta se divorciou de um homem vinte anos mais novo.
A minha tia era adolescente quando o cunhado do pai morreu deixando viúva e órfãos.
Dos órfãos ficou o primo Manuel, que foi acolhido na casa do tio e criado com filho em pé de igualdade com os primos.
O que não estaria previsto pelo meu bisavô era o sobrinho e a filha apaixonarem-se, pior concretizarem essa paixão.
Estamos a falar do final dos anos vinte do século passado.
A minha tia ficou grávida do primo, um escândalo!
O pai acabou por lhes dar um terreno, uma casa, nunca mais falou ou quis ver o sobrinho, que passou a genro.
Eles tiveram muitos filhos, não sei se viveram felizes para sempre, acho que não, basta dizer que só quatro filhos sobreviveram e foram muitos mais.
Acho que viveram como todos os casais, condicionados por múltiplas situações.
Lembro-me vagamente dele já afectado com uma trombose, lembro-me bem dela e do beijo diário que lhe dava ao passar pela sua janela, do quintal imenso, da cama de ferro deles, que acabou por ser a minha primeira cama de casal, do cheiro da casa, das paredes em gesso pintado a imitar mármore, da marmelada a secar em tabuleiros de esmalte.
Foi assim que eu tive um tio que era primo.

Comentários

mugabe disse…
Ana,...volta que estás perdoada...ahahahahahahah

Gostei de mais essa tua história familiar que daria um bom filme.

Abraço!
samuel disse…
Felizmente, a "loucura" é uma bênção que tem tocado muitos milhões, de geração em geração. Sem ela apenas haveria "vidinha"...

Abreijos
Fernando Samuel disse…
O amor é cego e surdo - felizmente não é mudo...

Um beijo.
Ana Camarra disse…
Mugabe- Eu estou sempre no mesmo sitio!

Samuel-Cá na famelga nem salta de geração em geração, acho que se refina!

Fernando Samuel-Nem sei se é surdo, cego? Tem dias...

Beijos
Zorze disse…
São vidas que se vivem e assim é há milhares de anos.

O tio com o primo que tinha um bisavô que era irmão do cunhado da mãe que tinha um genro casado com a madrasta da nora do vizinho meio-irmão da prima avó do sobrinho...

Beijos,
Zorze