Açucar, canela, chocolate, amendoas e carinho...



A Pascoa lá em casa, fosse a casa dos meus pais, da minha avó, dos meus tios, nada tinha a ver com a Via Sacra, a morte e ressurreição de Cristo ou com Êxodo comandado por Moisés, embora nessa altura do ano a televisão, no seu único canal a preto e branco, depois em dois e a cores, conseguisse o milagre de passar filmes históricos, raramente dos que gosto, mas antes daqueles chatos, a paixão segundo São qualquercoisa, depois por engano por engano ou para desanuviar lá aparecia o “Quo Vadis”, “Ben Hur” ou “Os Deus Mandamentos”, que eu via maravilhada como se nunca tivesse visto, não digam nada mas ainda hoje vejo e desejo sempre que no Bem Hur aquela tenha não escorregue para cima dos romanos, espero sempre que o Burt Lancaster vestido de Moisés, opte por ficar na corte egípcia e modificar a sociedade de outra forma que não seja com gafanhotos e a matar os filhos de ninguém, para além de que tenho pena do Yul Breiner fazer de mau, porque sempre gostei dele, no “Quo Vadis” tenho uma certa pena do Peter Ustinov na demência de Nero, alimentada por todos, e digo sempre que quem pega o touro na arena do Coliseu é um Português… Sempre achei que festejamos a Primavera, porque também acho que nesta altura que se inicio um novo ciclo, brotam e nascem coisas. Mas a Páscoa para além disso sempre foi outras coisas: espanhóis fugidos da austeridade da semana santa deles, a invadir todos os cantos com a sua fala cantada; um cheirinho de sol e flores bravias; muitas vezes o meu aniversário ou de alguém próximo porque um dos meses privilegiado para nascer gente na família é o de Abril e amêndoas, isso sim, amêndoas, é certo que se costuma fazer o folar, a minha avó fazia, a minha mãe também, também é certo que os ninhos de Pascoa são bonitos e têm um ar apetitoso, mas depois sabem a creme pintado, os ovos de chocolate, de pascoa, são sempre bonitos, a prata enchia os olhos, mas geralmente era uma desilusão, as amêndoas nunca me desiludiram, francesas, de sobremesa, molinhas de Coimbra, de chocolate, de pinhão, as Bonjour com formas de ervilhas, morangos e afins e acima de todas as feitas em casa. Açúcar em ponto, um pitada de canela, chocolate em pó, num tacho de cobre, as amêndoas lá dentro, mais umas mexidas com cuidado, despejar tudo na pedra mármore e separa-las rapidamente com a colher de pau.
Só como amêndoas cobertas nesta época do ano da mesma maneira que só como filhoses no Natal, acho que cada época tem o seu gosto especifico, o seu sabor proibido, permitido só naquela altura, das feitas em casa, este ano, só se as fizer eu, já não há quem as faça mais.

Comentários

Maria disse…
Eu ainda as faço. Essas. E outras, sem chocolate, só com açúcar....

Dias doces para todos aí.
Beijos
Fernando Samuel disse…
Revejo-me nessa Páscoa...

Um beijo.
Anónimo disse…
A minha Páscoa também era muito parecida com essa. Feliz Páscoa para ti
Zorze disse…
Ana

A Páscoa, Pascoela!
Tenho o previlégio de ter vivido Páscoas, com folares, ovos de chocolate e por aí adiante.
Ao mesmo tempo constatando que existem milhões e milhões de pessoas que comem carne uma vez por ano e muitas delas se for um ano de sorte.

Amanhã vou almoçar na Comporta!

Beijos,
Zorze