No filme Janela Indiscreta James Stewart leva todo o dia estacionado junto a uma janela, com a perna partida, as aparições de Grace Kelly aliviam o dia, mas a imobilidade acaba por levar a uma observação próxima da vida dos seus vizinhos, com o apoio da teleobjectiva, pensar que está paranóico e descobrir um crime...
A Grace Kelly nunca aparece cá em casa, nesta casa que temporariamente é minha, mas ainda bem, senão assustava-me e dava-lhe o desgosto de a informar que a filha está separada do terceiro marido, um príncipe de linhagem, mas pelos vistos um bêbado incorrigível, isto segundo uma revista cor-de-rosa (vês Brites? Pela boca morrem peixes e madrinhas), li um terço da revista e fiquei enjoada como se tivesse comido um bolo que em simultâneo tivesse doce de ovos, de chila, chocolate e caramelo, excessivo, tal como a revista, coisas simples mas também eu fui operada foi à perna não fiz uma lobotomia.
Mas a janela, a minha janela abre-se para o rio, vejo o Seixal, os fuzileiros em manobras, os barcos da “carreira”, alguns botes de pesca, as gaivotas a esgravatar na maré vazia, algumas garças por vezes, nascer e por do sol sempre diferente e sempre bonitos, ontem vi um ameaço de trovoada e vi uns raios clarear a noite de repente, eu sei que são descargas eléctricas da nuvens, mas podia ser alguém muito zangado comigo. O que não resulta porque gosto de ver trovoadas.
A janela é a minha montra para fora, a janela as aparições dos amigos, da família, que são no fundo formas de me abraçar, quando roubam um bocadinho do seu dia só para passar por aqui, ver se preciso de alguma coisa, a televisão também, mas confesso que estou farta das noticias e de outras coisas. A minha amiga deixa tudo a um nivél que eu possa chegar, aconchega-me na cama á noite, depois de me dar a injecção, eu tento ser útil a nivél mínimo, ontem dobrei peúgas, por exemplo, um amigo de sempre, daqueles que são como os relógios suíços, não falham, nunca, vêm cá todos os dias e avisa que está de prevenção, para mim para o que for preciso.
Eu faço para não me queixar, de um rasto de solidão, de uma ou outra lágrima teimosa, do ardor das bolhas que rebentaram e que me dão a sensação de ter parte da perna embrulhada em urtigas, de outras mariquices. Todos os dias estendo um pouco os meus limites, sem fazer avarias nem colocar o pé no chão, hoje já passou uma semana, é menos esta.
Bom, estou cansada, vou ali até à janela, volto já.
Comentários
Beijo
Pelo menos sempre te distraem umas horitas e vais ver que uma perna partida se torna um mar de rosas considerando as alternativas em exemplo... ;)
Beijo grande e rápidas melhoras.
Primeiro um beijinho
Eu penso aninha que mesmo que estivesses fechada num quartinho interior tu consiguirias ver o mar, o sol,amigos, tortas de chocolate, a agenda a ficar ultrapassada...
Era boa altura para fazeres aquela , a tal compilação de textos!!!
Que passe rápidamente essa paragem forçada.
Beijinho
Lagartinha de Alhos Vedros
Espero que a tua versão da adaptação de "Janela (In)Discreta" tenha que acabar por falta de tempo
devido à "condutora" da "Cadeira Mecanica Ferrari" já não ter necessidade de estar sentada à janela.
É que se estiveres muito mais tempo, ainda te lembras de organizar uma corrida de Formula CR
"Corridas de Cadeiras de Rodas tipo Ferrari's".
Bem, espero é que tudo esteja a correr dentro da normalidade prevista para casos idênticos, mas com mais celeridade, pela pessoa de fibra que és.
Ah. Não te zangues com o teu esqueleto se, eventualmente, a calcificação não se estiver a fazer à medida desejada da tua "velocidade".
PAZ e LUZ na tua casa
Um beijo.
Beijos,
Zorze