Foto de Armando Silva |
Os afectos são coisas que não se compadecem
com horários, numa conversa circunstancial, alguém sublinhou a sua idade, não
me importa, não penso nas pessoas com uma etiqueta no pé a indicar a idade, a
idade tem a relatividade do tempo, é verdade o cabelo como diz o fado vai
branqueando, o “involucro” começa a acusar o desgaste do uso e do tempo, mas é
isso?
Pois, não è.
A pessoa mais jovem que conheci
foi a minha avó, apesar de a ter conhecido quase sexagenária, ensinou-me
boleros, rumbas, tangos, sambas e áreas de opera, fados também, a fazer
biscoitos, a colocar alegria como tempero da vida, porque tal como canta
Vinicius a minha avó tinha como mote “È melhor ser alegre que ser triste, a
alegria é a melhor coisa que existe, é assim como a luz no coração…”
Quis sempre aprender, nunca se
fechou a novas experiências e projectos e o que não tinha remédio, remediado
estava!
Em contrapartida conheço gente
que nasceu velha, apesar da embalagem, de mentes retorcidas, bafientas,
fechadas, herméticas, e é tão triste uma mente amputada!
Portanto aprendi que não adiante acelerar
a levedura do pão, o crescimento, usar certos atalhos, nem tão pouco marcar
hora para os afectos, chegam na hora certa no momento exacto.
Não consegui ir despedir-me de um
amigo, daqueles de até sempre, mas o afecto está intacto, embrulhado em
carinho, e o olhar dos seus olhos grandes imensos e carinhosos fica, recebi um
mimo, prenda de aniversário, data que já foi, um frasco com um cheiro de
infância que fica ali guardado até vir os dias de sol, porque cheira a flores e
a citrinos e é fresco e alegre, e eu disse isso uma vez e alguém que me conhece
desde sempre lembrou-se e apesar de netos, de doenças e outras coisas, lembrou-se
e ofereceu, é outra que os anos passam, serei sempre a miúda e ela será sempre
a mulher vistosa, despachada e alegre.
Há outros afectos que guardo
assim, do homenzinho que hoje fez os trabalhos de casa e que vi crescer a
barriga da mãe como uma sementinha de gente, e é verdade ando ansiosa para que
chegue a primavera os dias luminosos, os cheiros da época, os sapatos mais
abertos, mas o que importa chega assim, no momento exacto, na hora certa, como
as flores de que temos saudades e um dia de repente reparamos, já abriram!
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