Lúcia acorda, acorda com as vozes dos locutores, cheios de alegria a jorrar entre as ranhuras do rádio despertador de números luminosos verdes e que lhe lembram que por muito que a chuva caia sobre o chão, por muito que lhe apeteça ficar um pouco mais entre os lençóis tem de ir, levanta-se calça os chinelos de quarto entra na casa de banho senta-se na sanita, passa para o duche evitando sempre confrontar-se com a outra mulher, desgrenhada e de olhos semicerrados que também finge não a ver do outro lado do espelho. A água pelas espáduas dá-lhe aquela sensação de conforto sempre boa, sai do duche quase com a mesma vontade que saiu da cama, abre a porta do quarto do filho e diz-lhe que são horas, em troca recebe o resmungo habitual, veste-se, enxuga-se, opta por uma saia prata e uma blusa de malha, a gabardine dos saldos do ano passado, a mala, o saco com uma fruta, o chapéu-de-chuva, abre uma amostra de perfume, mira a outra ao espelho, e pensa “Estás muito bem para uma bancária quarentona, divorciada!”
Volta a lembrar o adolescente meio morto que está na hora, pede-lhe para se vestir de acordo com o tempo, deixa-lhe as moedas em cima da mesa, junto aos cereais, entra no elevador “Bom dia Dª Lúcia, lá vai para a labuta?” “Têm de ser Sr. Fonseca”
Comentários
Tu mesmo só com um pé, estás a atirar muitabem!
Beijoca, e as melhoras.
Conheço tantas Lúcias como a que retratas.
Este modo de vida que as pessoas se conformam porque, é porque é, frutifica nas suas várias valências sociais e geográficas, vidas assim, quase sem reparar que se vive.
O apelidado mundo desenvolvido, não é mais do que uma tremenda ilusão, quando de uma nova de escravidão se trata.
O stress, a falta de tempo, a desumanização das relações, onde tudo é a correr. E fundamentalmente, se a Lúcia for uma muito bonita mulher, também não há tempo para reparar, nela transparente, quase zombie da rotina do dia-a-dia.
Beijos,
Zorze
beijos e abraços desta tua azinheira dedicada
Um beijo.
Leonor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.
Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata,
Sainho de chamelote;
Traz a vasquinha de cote,
Mais branca que a neve pura.
Vai fermosa e não segura.
Descobre a touca a garganta,
Cabelos de ouro entrançado
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta.
Chove nela graça tanta,
Que dá graça à fermosura.
Vai fermosa e não segura.
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Luís de Camões
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Lúcia é mais uma Leonor, mas do século XXI, sem poetas que a cantem ou encantem, sem que lhe gabem beleza ou formosura, mais uma Leonor, mais uma Lúcia, mais uma Maria, Ana, Clara, mulheres que embora não pareçam, vão descalças mas não pela verdura, aparentemente formosas, mas seguramente não seguras.
Beijo
Ouss
Linda música!
Um espaço de paz onde nos sentimos bem!
Bom ano para ti aninha!
Bom dia de reis
um abraço
Lagartinha de Alhos Vedros