Assisto outra vez a uma morte em prestações de um familiar directo. Sempre que um novo médico me pergunta se alguém teve ou morreu de doença cancerosa na família directa respondo: Todos!
Explico: pai, avó, tio-avô, tia, bisavó, todos morreram dessa coisa surda e degradante, mãe, irmã, tia e eu própria temos vivido num limbo.
Como pessoa curiosa, assisto, quando me é possível a tempos de antena, ouço um partido novo falar que é favor da vida, desde a concepção à morte natural.
Pergunto-me a mim própria o que é isso, na concepção já me morreu um ser dentro de mim, se não morresse matava-me porque estava alojado onde não devia, aliás quase me matou, nunca o assumi como filho, nem sabia que existia até uma dor brutal me ter estrangulado as entranhas e me ter enviado para um bloco operatório de urgência.
Quanto à morte natural, não encaro estas mortes a que assisti, de pessoas queridas, muito queridas, como naturais.
Ter de aceitar o olhar firme da minha avó a transmitir-me que não queria viver assim, entre fios e tubos, ter assistir durante longos meses a procedimentos dolorosos que um a um retiravam a dignidade ao meu pai, sem lhe retirar a consciência que nada servia para melhorar nem tem pouco minorar um sofrimento intenso, abraçar-me à minha tia que chorou nesse abraço, tendo as duas consciência que nunca, nunca mais poderíamos trocar esse carinho, agora assisto a mais uma norte a conta gotas.
Não sou capaz de matar mais que um mosquito, se tivesse que matar um bicho para comer, envelheciam as galinhas e eu tornava-me vegetariana.
Há qualquer coisa que morre connosco nestes processos e eu estou saturada de morrer aos bocadinhos.
Explico: pai, avó, tio-avô, tia, bisavó, todos morreram dessa coisa surda e degradante, mãe, irmã, tia e eu própria temos vivido num limbo.
Como pessoa curiosa, assisto, quando me é possível a tempos de antena, ouço um partido novo falar que é favor da vida, desde a concepção à morte natural.
Pergunto-me a mim própria o que é isso, na concepção já me morreu um ser dentro de mim, se não morresse matava-me porque estava alojado onde não devia, aliás quase me matou, nunca o assumi como filho, nem sabia que existia até uma dor brutal me ter estrangulado as entranhas e me ter enviado para um bloco operatório de urgência.
Quanto à morte natural, não encaro estas mortes a que assisti, de pessoas queridas, muito queridas, como naturais.
Ter de aceitar o olhar firme da minha avó a transmitir-me que não queria viver assim, entre fios e tubos, ter assistir durante longos meses a procedimentos dolorosos que um a um retiravam a dignidade ao meu pai, sem lhe retirar a consciência que nada servia para melhorar nem tem pouco minorar um sofrimento intenso, abraçar-me à minha tia que chorou nesse abraço, tendo as duas consciência que nunca, nunca mais poderíamos trocar esse carinho, agora assisto a mais uma norte a conta gotas.
Não sou capaz de matar mais que um mosquito, se tivesse que matar um bicho para comer, envelheciam as galinhas e eu tornava-me vegetariana.
Há qualquer coisa que morre connosco nestes processos e eu estou saturada de morrer aos bocadinhos.
Comentários
Abreijos.
Saudações de outro Barreirense
Eu compreendo o que sentes. Quando a minha mãe morreu, eu tinha estado com ela na vespera, uma sexta-feira e nunca tinha visto a minha mãe tão risonha e a beijar o meu filho, o neto que ela mais queria, daquela forma.
No dia seguinte, o meu sabado correu-me quase perfeito até que cheguei a casa.
A incapacidade que eu senti nesse momento, a impotência estranha perante um facto que se estava a passar perante mim e que eu sabia não ser capaz de parar, deixou-me um travo amargo, que ainda sinto.
Por isso, a unica coisa que te posso dizer é que te acompanho nessa luta contra um facto que se sabe ser inevitável.
Assim eu pudesse fazer regredir todos os males.
Um abraço, muito fraterno.
É a ordem natural da vida.
Todos nós passamos por estas situações, sempre difíceis.
Mas, a partir do momento em que nascemos começamos a morrer.
É o oxigénio que nos permite viver é ao mesmo tempo o que nos mata aos poucos. Cria em nós a ferrugem.
A vida em si é uma tremenda contradição.
Beijos,
Zorze
nunca de importante se perde, porque também nunca tivémos. comigo caminham todos os amigos que deixei de os ter, todos os mortos que amei, todos os dias felizes que passaram e todas as tortas de chocolate do tico-tico que enfardei. a isto se chama vida, a vida que vivemos todos os dias.
nesta e todas as outras alturas da nossa vida aceita um beijo amigo do
teu vizinho de cima
Grande abraço!
ana,como compreendo o sofrimento de quem vê partir, aos poucos numa longa e agonizante espera. desde cedo. o meu melhor amigo, meu colega de carteira, foi...novo...muito novo... não tinha 18 anos.
Quanto a nós, ana , estamos aqui.
sei que o calor de um abraço, precisa-se.
deixa passar as eleições, que já terás mais um amigo a abraçar-te.
entretanto,
um abraço do vale
beijo
Um beijo grande.
Não é preciso dizer nada mais.
LBJ
Pois temos de ter coragem, até porque estamos vivos.
Akhen
A morte é inevitável, a única coisa inevitável, o sofrimento é evitável, o físico, claro!
Filipe
Obrigado, é um conforto dos de carne e osso e virtuais.
Zorze
Ainda não existem anti ferrugens para pessoas.
Meu querido vizinho
Os meus também, todos os dias tenho algo que gostaria de discutir com o meu pai, há episódios que acho que a minha avó teria adorado, tenho o impulso de telefonar à minha tia só parta lhe contar uma anedota nova.
È este compasso de desgaste na recta final que me mata um bocadinho.
Cidadão
È, muito.
Duarte
Dói sempre.
Anónimo
Obrigado
Fernando Samuel
De forma por vezes quase insuportável.
Mar Arável
Outro.
Obrigado a todos pela atenção que deram a este meu desabafo
Beijos
foram anos e anos de quimicos no arn na terra e nas águas.
pode nada ter a ver mas penso que sim.